Teu Mundo

Teu Mundo
Márcio Proença e Jorge Vercillo

As linhas 11 a 14 dão a dinâmica da letra, que diz: “Teu mundo é assim, falsa genética. Tua emoção, aritmética”. Não se trata apenas da licença poética usada nestas linhas, mas de uma, quase, realidade biológica. Realmente as mulheres têm mecanismos biológicos diferenciados que as direcionam na reação ao mundo que as cercam. As reações masculinas, igualmente direcionadas por mecanismo biológico próprio, fazem os homens reagirem de forma característica. São anima e animus, o feminino e o masculino em sua complentaridade.
Contudo, os mecanismos biológicos não são deterministas. Os condicionamentos ocorridos ao longo da vida de mulheres e homens interferem, normalmente em maior ou menor grau, nas reações de cada um. Assim, há mulheres com reações predominantemente racionais e homens com reação onde a emoção predomina. São exceções, mas existem.
Este é o caso dos personagens da letra. Uma mulher racional e um homem emocional. Uma espécie de feijão e sonho invertida.
A música vai frase a frase revelando os ardis da personagem feminina. O interessante que ela não é falsa, ou seja, uma pessoa que deliberadamente finge ser o que não é. Ela se refugia atrás de um escudo de cristal que acredita ocultá-la. Eu a vejo muito mais como uma escapista. Alguém que se cerca de artificialidades para evitar o confronto com o mundo real das emoções.
Se uma situação emocionalmente difícil é trazida à tona sob a claridade solar, ela escapa. E o seu “Sol é de néon”. As suas lágrimas decorrentes do falso enfrentamento são “Chuva artificial”.
O coração da escapista não é “uma vermelha flor” constituída de carne, sangue e emocionalidade. Em seu mundo pasteurizado pelo escapismo as “flores são de crepom”, suas “estrelas de cetim” formam constelações num “céu de papel” onde as “nuvens são silk scren”.
Pobre mulher que não aceita, como real, o que sua natureza lhe aponta cada vez com mais veemência, a sabedoria de que a cura do sofrimento está na dor vivida e não na dor adiada. Ela se refugia no mundo da racionalidade, que lhe parece ser natural, porém, é natural para o mundo de predomínio masculino. E assim vai a cada passo, a cada frase da poesia, evitando o encontro com as descontroladas chamas da paixão. Vai se endurecendo emocionalmente e se transformando em estátua fria. A cada passo mais perto ela fica de seu destino longamente semeado, o da solidão.
O que o poeta vê e descreve é de precisão cirúrgica como o diagnóstico de um exímio psicoterapeuta. “Riso de atriz, dom de representar. Frases de giz, fáceis de se apagar. Teu mundo é assim, falsa genética. Tua emoção, aritmética. Teu coração usa essa máscara, para se ocultar dos deuses da paixão. Mas é real como estátua. Imperial, na tua solidão”.
A emoção principal para a interpretação desta música deve ser a de lástima, sem crítica. Cabe constatação mas não cabe julgamento. Deve haver na voz um sutil convite para a recuperação dos se encontram nessa situação emocional. Uma dose, mesmo que mínima, de esperança deverá estar presente na voz da interprete.

Teu mundo
Márcio Proença e Jorge Vercillo

Sol de neon chuva artificial
Flores crepom isso me faz tão mal
Teu mundo é assim
Estrelas de cetim
Céu de papel
Nuvens de silk scren
Riso de atriz
Dom de representar
Frases de giz
Fáceis de se apagar
Teu mundo é assim
Falsa genética
Tua emoção
Aritmética
Teu coração usa uma máscara
Para ocultar os deuses da paixão
Mas é real como uma estátua // imperial
Na tua solidão